segunda-feira, setembro 10

Teste 065

TIMIDEZ DESFERIDA
(Beatriz e Gustavo - nomes meramente ilustrativos)

Era a primeira vez que aquilo acontecia.
O grande grupo de universitários enfim dispunha de todos os integrantes solteiros; tinham que comemorar. A prima de Victor, um dos estudants de engenharia, finalmente superara o fim dramático de seu último namoro, e foi convidada à festa sem qualquer hesitação. As luzes agitavam-se, misturadas aos corpos dançantes espalhados no grande salão; a música era ensurdecedora. Quando Beatriz chegou à danceteria, estava decidida a, no máximo, trocar alguns beijos frios - "Ou nem mesmo isso", pensou ela, distraída. Encontrou Victor no bar e foi conduzida até o grupo de amigos, trocando sorrisos desajeitados que mencionavam o prazer que tinham em conhecerem-se.
Beatriz já havia dispensado uma dúzia de pretendentes quando um homem alto se aproximou, alegre, com uma pequena garrafa de cerveja em cada mão. Ele a chamou e ela o encarou, atordoada. Podia jurar que nunca o vira antes, mas ele lhe tratava como íntimo. Pediu para que segurasse ambas as garrafas por algum momento e alargou um sorriso bonito.
"Gustavo" anunciou, cortês. Beatriz observou-o atentamente, sentindo o suor gelado do vidro em suas mãos. "Não fomos devidamente apresentados, mas faço parte daquilo ali" meneou a cabeça em direção ao grupo tumultuado no qual Victor se encontrava. Ela revirou os olhos, entoando um discurso sobre não estar interessada, mas não foi capaz de dar continuidade; ele tapou-lhe a boca. Se o mundo fosse como nos desenhos animados, Beatriz estaria vermelha e com uma veia estourando na testa, mas estava apenas com uma expressão desagradável: não o suportava!
As horas passaram e Beatriz corou ao se dar conta de que se divertia. Victor lhe chamou em um código genérico e familiar, ela lançou um último olhar para o novo amigo e lá se foi: era hora de voltar para casa. Enquanto ela dormia tranquilamente em sua cama alcochoada, desconhecia a realidade de quem conhecera mais cedo. Exausto, empriagado, mas empertigado. Adormeceu no sofá, mesmo, com as roupas com as quais chegara, e os dois esperaram, inconscientemente, que a manhã chegasse.
Um bipe despertou Beatriz de seus sonhos confusos e ela tateou, desajeitadamente, a cômoda, à procura do celular. O visor indicava que o número era desconhecido. Franziu o cenho e atendeu, preguiçosa. "Quem é?" resmungou, trôpega.
"Beatriz, é Gustavo, lembra-se de mim?" Ela acordou por completo ao ouvir a voz rouca do outro lado da linha; sabia que não lhe tinha dado qualquer meio para que voltassem a se falar, mas... "Será que você poderia me encontrar na sorveteria? Te encontro lá em uma hora, exatamente" e desligou. Beatriz fitou o telefone, desconcertada, sem saber bem o que fazer em seguida. Simultaneamente, Gustavo passeava pela casa apressado, arrumando-se; estava uma pilha de nervos.
***
Beatriz e Gustavo namoraram por sete anos e jamais se cansaram. Os amigos de Gustavo até hoje riem por Beatriz tê-lo apaixonado na primeira oportunidade que tiveram de assumirem-se todos descompromissados. Beatriz descobriu que Gustavo era um homem bastante tímido e que algo como puxar uma conversa com uma estranha não lhe seria possível nem mesmo depois de porre pesado; o destino sempre acaba dando o seu jeito de fazer as coisas acontecerem. Casaram-se há quatro anos e estão juntos há onze, mas ela ainda insiste em recebê-lo decentemente todas as noites, devidamente perfumada e doce. Os anticoncepcionais já foram abolidos da vida do casal e estão nos preparativos finais para a chegada de um filho.
Estão radiantes com a companhia um do outro.

Beijocolates,
#V

segunda-feira, setembro 3

Teste 064

Este episódio romântico relatarei de modo inteiro; não há muito do começo nem do fim, mas muito da melhor e da pior partes. Divirtam-se!

CONCEDA-ME UMA DANÇA
(Higor e Virgínia - nomes meramente ilustrativos)
Havia quase um mês desde que acabara, mas ela não conseguia evitar a nostalgia que a acometia sempre que ele adentrava seu campo de visão. Higor. O garoto que lhe prometera amar para sempre, que fizera planos e rira escolhendo os nomes para os futuros filhos. Virgínia correu apressada para o banheiro, sentindo uma pressão esmagando seu crânio: estava prestes a chorar.
Era uma manhã de quinta-feira e Virgínia mal conseguia respirar de tanta ansiedade, atravessando as ruas perigosamente distraída. Se aproximava cada vez mais do local combinado, e não o enxergava em lugar algum. Higor levantou-se, sorrindo, Virgínia desviou o olhar, encabulada. Cumprimentaram-se nervosamente, sem saber como deviam reagir na presença um do outro, e poram-se a andar, sentindo a maresia acabar-lhes os cabelos.
Virgínia apertou os olhos com força, negando-se a derramar mais uma lágrima, e recordou-se de si mesma sozinha, esquecida debaixo da chuva, soluçando. Não podia suportar a dor, mas não podia deixar que emergisse. Foi acometida mais uma vez por historias lassas que jamais teria de volta e tapou a boca para abafar um grito de pavor genuíno.
"Você está linda" ele disse, afastando os fios emaranhados do rosto dela. A garota sorriu, pouco convencida, e sentiu os braços envolverem-na com carinho raro. E sentiu-se completa e protegida, naquele abraço. "Nunca fui tão apaixonado por alguém" Higor declarou, os olhos procurando o amendoado que a si lhe parecia o tom claro dos olhos maternos. A face de Virgínia iluminou-se, e ela beijou-lhe suavemente os lábios, sentindo a brisa salgada envolver os dois.
As recordaçōes apaixonadas lhe pareciam golpear o estômago, cada vez mais forte. A enxaqueca aumentava gradativamente, assim como os minutos passavam, e lá estava ela, trancada em um dos sanitários individuais, mordendo os dedos em vã tentativa de acalmar-se.
"Sua filha me faz muito feliz" Virgínia corou, encantada, e seu pai admirava o casal apaixonado à frente, com um sorriso discreto e pouco petulante, ao vê-los selarem as bocas por frações de segundo. Higor fitou a namorada por um bom tempo, satisfeito e sinceramente feliz. Ele sabia que ela também sentia-se assim. Entrelaçou os dedos aos dela, acariciando-lhe a mão com o polegar, e levou o conjunto de encontro à própria bochecha, flertando de um modo bobo e fascinante.
A umidade não cessava e seus olhos pareciam cada vez mais perto de transbordar. Virgínia respirou lenta e pausadamente, mas não pode evitar um engasgo choroso. E não pôde mais aguentar.
O contato entre os dois era urgente e desesperado: um precisava do outro mais que tudo no mundo. Os beijos eram carregados de palavras, sentimentos e tudo o mais que jamais poderia ser explicado, mas já não havia tempo, ele teria de ir embora. "Só mais dez minutos, Gina..." e beijou, fracamente, todo o seu rosto, tentando-a. Ela tentou conter-se, exasperada, mas sentia-se mole demais para fazer qualquer coisa. Abriu os olhos de súbito, encarando-o, assustada, e empurrou-o levemente, deixando-o aturdido. "Céus, Higor, acho que amo você" e uniu as bocas mais uma vez.
Ela apenas deixou que as lágrimas escorressem, quentes, por seu rosto, sem mais detê-las. Não queria parecer fraca, mas sabia que não precisava ser forte: ninguém a observava. Os papéis arranhavam-lhe a pele, mas Virgínia continuava secando-a, secando-a... Até que os dutos lacrimais secassem por inteiro.
Um risinho masculino fez-se escutar pelo quarto de Virgínia e ela revirou os olhos, divertida. "Desculpe, amor, prometo não incomodar" Higor prometeu, e Virgínia sabia que não honraria a promessa. Voltou a atenção ao reflexo de seu rosto, tentando maquiar-se dignamente, e sentiu que um olhar pesava sobre si. Um beijo foi depositado em seu pescoço, enquanto as mãos envolviam-lhe a cintura por trás. Higor a fez ficar de frente para si, mas o movimento brusco fez o pó compacto cair no chão. Ela encarou o namorado de forma repreendedora, com os braços cruzados, e o fez ver a maquiagem destruída; Higor apenas sorriu e puxou-a para mais perto, ignorando os protestos que cessaram com o primeiro toque suave.
Virgínia levou algum tempo para estabilizar-se. Destravou a cabine, receosa, e lavou o rosto com a água fria disponível. Contemplou a face levemente inchada e avermelhada, e ergueu o rosto, destemida a encarar todo o turno que tinha pela frente. Uma última cena lhe passou à mente, mas ela pôde sorrir, adentrando a sala de aula. Desculpou-se pelo atraso, sentou-se à banca e abriu o caderno para tomar suas anotações.
O som era agradável aos seus ouvidos, o corpo era conduzido pela música. Higor aproximou-se, hesitante, e murmurou: "Virgínia, é um pouco constrangedor, mas... Eu não sei dançar isso, será que você..." Ela virou-se, divertindo-se com a falta de jeito do rapaz e o interrompeu, no meio de uma frase: "Mas é claro que sim."

Beijocolates
#V